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Editorial 136: Vales, valores e reparações
Por Livia Rangel
Publicado em 24 de novembro de 2015 às 14:48
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Quanto vale uma vida? Quanto vale um rio? Quanto vale o “progresso”? O rompimento de uma barragem de rejeitos de minério da Samarco causou uma enxurrada de lama misturada a rejeitos de produção no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na região Central de Minas Gerais.
Diretamente, a lama vai afetar os municípios capixabas de Baixo Guandu, Colatina, Marilândia e Linhares, cortados pelo Rio Doce. Indiretamente, também estão na “fila do prejuízo” as cidades de Anchieta, sede da unidade industrial da Samarco, e Guarapari, onde vivem centenas – senão milhares – de trabalhadores da fábrica e terceirizados.
O passivo ambiental e social é incalculável, mas alguns valores já começam a ser definidos. No ES, a Samarco já assinou um Termo de Compromisso Socioambiental (TCSA) com os Ministérios Públicos do Trabalho, Estadual e Federal em que se compromete a adotar medidas emergenciais. Entre elas, a distribuição de água potável, a contratação de laboratórios para coleta e análise da água do Rio Doce e do mar e até o pagamento de salário para pescadores, lavadeiras e pessoas que dependem do Rio Doce para sua sobrevivência. A multa é de R$ 1 milhão por dia de descumprimento. Quantia que praticamente desaparece ao lembrarmos que o lucro obtido pela empresa no ano passado foi de R$ 2,8 bilhões.
Ao mesmo tempo não podemos ser hipócritas ao ponto de dizer “bem-feito, pronto, acabou, vai embora daqui”. Porque a maioria das nossas famílias precisa – direta ou indiretamente – da renda obtida com a Samarco.
Os empregados da mineradora estão com os postos de trabalho garantidos somente até o começo de janeiro. Ate lá, férias coletivas com a produção paralisada. Com menor responsabilidade, as terceirizadas que já estavam demitindo desde o final das obras da quarta usina de pelotização, aumentaram a intensidade das rescisões.
E sem renda, como comprar comida, roupas, medicamentos? Como custear a educação dos filhos? Muitas escolas particulares começaram a repensar estratégias para manter as rematrículas, enquanto escolas públicas se preocupam com o grande número de pedidos de transferência até o final do ano.
Quanto mais cavamos as respostas, mais lama aparece. E com um gosto metálico na boca difícil de esquecer.
Fica a pergunta: com tantos investimentos em novas tecnologias para aumentar a produção, por que o método de contenção dos rejeitos ainda é feito de maneira tão arcaica? Usar a própria topografia do local para represar a lama era arriscar alto demais e as consequências estão aí e ainda vão perdurar por muitos anos. Uma empresa que sempre se orgulhou de primar pela segurança no trabalho e prevenção de acidentes, como se estivesse no alto de uma montanha, deveria ter olhado aquele vale hoje condenado com mais atenção.
Neste momento, direção e acionistas da empresa (a brasileira Vale e a australiana BHP) e políticos continuam com o discurso que “Ainda não é hora de discutir os efeitos a médio e longo prazo” e ainda afirmar em coletiva de imprensa que “Não podemos dizer que a tragédia poderia ter sido evitada” ou “Não é o caso de pedir desculpas à população”. Qual seria o caso então? E qual a hora oportuna? Tudo não passou de um golpe de azar? Quanto mais cavamos as respostas, mais lama aparece. E com um gosto metálico na boca difícil de esquecer.
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Falta de solidariedade. Incrível o silêncio do prefeito Orly Gomes sobre o ocorrido. Desde o dia do rompimento das barragens até o fechamento desta edição, não houve nenhum pronunciamento oficial do chefe do Executivo. Nem mesmo uma nota de pesar, solidarizando-se com a situação delicada da cidade vizinha, Anchieta, ou com o povo de Minas Gerais, que tanto gosta da nossa cidade. Parece até que não haverá nenhum impacto na cidade Saúde, que está com todos os moradores bem-empregados, com arrecadação de impostos em alta e nenhum problema na prestação dos serviços essenciais. Só que não.
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